Motivação, função e reforço do comportamento: O caso Loki

O Loki, tal como muitos outros cães não gosta de ser abordado por estranhos que entram no seu espaço e tentam tocar-lhe.

Ladrar efusivamente (e por vezes investir na sua direção) foi um dos comportamentos que o Loki adoptou para os afastar.


Todos os comportamentos têm uma motivação (endógena e exógena) e uma função.

Com os comportamentos referidos, e sendo o Loki um cão com algumas inseguranças, que não se sente confortável com desconhecidos e tendencialmente ansioso na sua presença, podemos dizer que a função do seu comportamento era criar distância entre ele e o estranho (um estímulo aversivo do ponto de vista do Loki).

Neste sentido, a motivação exógena do seu comportamento prende-se com uma tentativa de ver restabelecida a sua segurança.

Perguntamos: funcionava?
A reposta é simples: na maior parte das vezes sim!

Isto tem a ver com a aprendizagem, e com a motivação exógena e endógena para o comportamento.

Motivação, função e reforço do comportamento: O caso Loki

O Loki aprendeu que ladrar, e investir na direção do estranho quando este se aproximava demais (mais uma vez do seu ponto de vista) era uma forma eficaz de o evitar e /ou afastar (motivação exógena).

O que é que o Loki sentia quando o estranho se aproximava?

Tendo em conta o historial do Loki, muito provavelmente medo.

O que é que ele sentia quando ele se afastava?

Um alívio profundo!

Aqui falamos então por um lado de aprendizagem, historial de reforço de comportamento, e por outro daquilo que é a motivação endógena para o mesmo.

Porque estes comportamentos estão ligados ao medo, e o Loki tem sucesso quando os exibe, a motivação endógena e o reforço dos mesmos é enorme devido à libertação de dopamina (neurotransmissor e hormona) no cérebro e no corpo que prevê a libertação de opioides ligados à subsequente sensação de alívio.

Na ausência de outras formas de lidar com a aproximação de estranhos, esta era a maneira mais rápida e eficaz para lidar com estas situações.

Assim, trabalhamos no sentido de ensinar ao Loki que era possível apresentar outros comportamentos alternativos que levassem ao mesmo fim.

Motivação, função e reforço do comportamento: O caso Loki

Ensinamos-lhe que o olhar para os cuidadores, ao invés de ladrar e se lançar quando não se sentia confortável era uma forma de sair da situação desconfortável, ganhando espaço e uma recompensa. Desta forma reforçamos o comportamento desejado criando ao mesmo tempo uma associação positiva com os estranhos.

Importa dizer que o temperamento do Loki, a falta de sociabilização e exposição ambiental durante a infância, uma inadequada estimulação social e sensorial e possíveis experiências adversas durante as primeiras semanas de vida no abrigo, podem ter tido um papel crucial no desenvolvimento do medo a estranhos.

Este medo de estranhos era exacerbado na presença de um dos membros da família que embora não vivesse na mesma casa que o Loki, fazia parte da família e as visitas e convívio eram frequentes.

O desconforto do Loki na sua presença rapidamente se desenvolveu, tornando-se uma situação pensosa para todos.

Na sua presença, o Loki apresentava comportamentos como ladrar efusivamente, de evitamento e fuga, chegando após uma exposição mais duradoura, a apresentar sinais de stress elevados e pânico como tremores e retirada prolongada para locais considerados por ele seguros. Ou seja, escondendo-se debaixo da cama e negando-se a sair enquanto a pessoa (objeto de medo) estivesse presente.

Olhando à função do comportamento do Loki, facilmente percebemos que se prendia com a tentativa de aumentar a distância entre si e o seu “objeto de medo”.

Assim, a motivação exógena seria restabelecer a segurança, sendo a base motivacional endógena causada pelas mudanças fisiológicas e hormonais decorrentes da ativação das áreas do cérebro responsáveis pela resposta à deteção de perigo/ameaça (eixo Hipotálamo - Pituitária-Adrenal)dando-se a libertação de adrenalina e cortisol (entre outras) conhecidas como as “hormonas do stress”.

Na medida em que a “ameaça” permanecia não conseguindo o Loki “livrar-se” dela, fugia, procurando refúgio, permanecendo o organismo num estado de alerta constante levando a elevados níveis de ansiedade e stress prolongado.

Assim, utilizamos técnicas de dessensibilização e contra -condicionamento com enfase no condicionamento clássico no sentido de expor gradualmente o Loki à presença do estímulo negativo condicionado (membro da família), de forma a modificar a resposta emocional condicionada (medo) construindo associações positivas com o seu aparecimento e permanência.

No fim, e depois de um longo trabalho foram estes os resultados:

“Há uma semana os meus pais estiveram cá em casa. O à-vontade no comportamento do Loki foi notório! Apesar de não serem melhores amigos está claramente mais confortável. Correram juntos de manhã e depois ainda teve direito a sentarem-se perto no sofá.”

Quando desenhamos um plano de intervenção, embora focados num problema em particular, acabamos por ter resultados positivos em outros campos na medida em que trabalhamos o estado emocional e conseguimos que os comportamentos sejam generalizados.

“Hoje estiveram cá uns amigos com o menino deles. A diferença no comportamento do Loki é gigante!”


Obrigada à família do Loki pela confiança, obrigada Loki por confiares em mim e me deixares aprender contigo.
Estão todos de Parabéns.



Referências bibliográficas:

Lindsay, Steven (2000) Handbook of Applied Dog Behavior and Training: Adaptation and Learning, (Vol. 1) 1st Edition. Blackwell Publishing, Iowa State University Press.

Lindsay, Steven (2001) Handbook of Applied Dog Behavior and Training: Etiology and Assessment of Behavior Problems (Vol. 2) 1st Edition. Blackwell Publishing, Iowa State University Press.

Lindsay, Steven (2005) Handbook of Applied Dog Behavior and Training: Procedures and Protocols (Vol. 3) 1st Edition. Blackwell Publishing, Iowa United States of America.

O’Heare, J. (2005) Canine Neuropsychology 3rd edition. BehaveTech Publishing, Ottawa Canada.

Overall, Karen (2013). Manual of Clinical Behavioral Medicine for Dogs and Cats - E-Book. Elsevier Health Sciences. Kindle Edition.

Panksepp, J. & Biven, L. (2012) The Archaeology of Mind: 1st Edition. MidAtlantic Publishing Services, United States of America

Scholz, M. & Reinhardt, C. (2007) Stress in Dogs. Dogwise Publishing, Wenatchee, Washington, United States of America.


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